
Este gosto que eu tenho de me perder por entre a multidão.De calcorrear as ruas, de andar nos transportes públicos (sim mesmo correndo o risco de apanhar a Gripe A). Gosto das primeiras horas da manhã quando as pessoas se dirigem para o seu emprego, gosto do anoitecer quando as luzes se acendem. Gosto de me perder no meio das pessoas, olhar os seus rostos e tentar adivinhar as suas vidas! Aquele casal, será tão feliz, como aparenta? Aquele homem é realmente assim tão sisudo ou sabe ser interessante, contar uma boa história, dar uma boa gargalhada.É uma qualidade que eu aprecio: que me façam rir, não o fazer palhaçada,mas aquele humor inteligente, dito na altura apropriada.Provavelmente, não me faço entender, nem eu própria me entendo hoje,mas estou assim: fim-de-semana grande, Lisboa, os amigos à espera, mas apeteceu-me perder,porque é segunda-feira e nem toda a gente fez "ponte"como eu.Andei de eléctrico, fui até aos Jerónimos, de manhã, a maioria das pessoas com o ar de que "graças a Deus, amanhã é feriado", outros com ar de quem deveria ter ficado em casa.Vim a pé até à Junqueira, adoro aquelas ruas, aqueles antigos palacetes, convidam-me a imaginar vidas passadas, as tristezas, as alegrias, os nascimentos, as mortes. Adorava entrar na maioria deles e vê-los por dentro.Apanhei o autocarro e desci no Cais do Sodré. Lá fui à Ribeira beber um Nespresso e comer uma léria(ai o meu colesterol). Pronto, mais uma confissão:sou gulosa e se forem doces conventuais, ainda por cima...Subi e desci aquelas ruelas, passei pela rua de S.Paulo, e subi até ao Largo de Camões, passei o resto da tarde com uns amigos e voltei para casa.Do terraço dos meus pais, quase um miradouro( se bem que ache que deveríamos dizer Miratejo, mas isso são outras histórias),vejo as luzes a acenderem,e imagino que naquele 1ºesq, do prédio amarelo vive uma família feliz, os filhos chegaram da escola e contam aos pais o seu dia, os pais também falam do seu trabalho,e então começam as tarefas normais. A mãe prepara o jantar, a filha mais velha põe a mesa o pai dá banho ao mais novo e veste-lhe o pijama.Nah, demasiado idílico. Do outro lado da rua vive aquela jovem de ar embirrantemente intelectual, aquela que entra no minimercado e nem Bom-dia diz, sempre de nariz empinado:é uma infeliz, não tem amigos, nunca recebe visitas,come refeições congeladas e passa a vida sózinha, ligada ao computador, a amigos distantes que não conhece,mas gosta de criticar, porque é esse o seu feitio, ou então que gosta de bajular, porque só assim consegue fazer amigos:à distância, sem ter que se dar, sem ter que confiar. Agora imagino que eu sou ela: também estou aqui a escrever, num acto tão solitário como andar perdida na multidão, também o estar aqui a relacionar-me com ninguém, faz com que não precise de me dar, que não precise de voltar a confiar.A única coisa que nos torna diferentes é o eu gostar de sorrir e de dizer Bom-dia, no Minimercado,mesmo que não conheça D.Maria.